quinta-feira, 15 de março de 2007

Resposta ao Helder Menor

Amigo Helder,

Não me reconhecendo, conforme deves imaginar, na abordagem à Jack Estripador que fizeste à minha missiva, vou-te entregar a resposta numa forma que entendo descomprimir o discurso. Dir-te-ei que a segmentação de uma resposta, na forma que usaste revela mais das tuas próprias fraquezas e dos pontos em que te sentiste tocado do que propriamente ataca o discurso e os conceitos patentes na carta que escrevi. E ao revelar as tuas fraquezas, revelas de alguma forma as fraquezas do grupo a que pertences. Aceita portanto o meu comentário de forma pedagógica.

Em primeiro lugar, relativamente às razões que invocaste para comentar a minha carta, deixa-me dizer-te que o facto de a carta ser pública não impede que tenha um destinatário. Admito que, como membro do que afirmas ser um colectivo, te sintas tocado por uma mensagem dirigida a uma tua camarada e, por seres dotado de um voluntarismo e de um espírito cavaleiresco que te reconheço, tenhas acorrido em defesa dela. A defesa que fizeste foi provavelmente prematura pois não curaste de tentar saber a amplitude de publicidade que esta carta pode vir a ter junto da comunicação social, pelo que a tua suposição acerca de debates semi-privados e de razões de ética governativa que impeçam alguém de responder, para mim, não tem qualquer fundamento. Não reconheço essa “ética” a não ser que a traduzas para “instruções do partido”. Achei curiosa a insinuação acerca das expectativas dos munícipes, que sugere que a Vereadora Regina Janeiro está num plano tão elevado que nem se dará ao incómodo de responder a um simples e anónimo munícipe como eu.

Neste particular deixa-me ainda estranhar que consideres haver meios e espaços próprios para a Democracia. Para mim, a Democracia é como o Natal, é quando o homem quiser, e devia ser todos os dias e em todos os lugares.

Reconheço, no entanto, que os vinte anos de argumentação política que temos mantido, te dão o direito de não querer perder esta oportunidade, estavas mortinho por me bater e até convidaste o Jack Estripador para te ajudar.

Em segundo lugar vejo que a minha carta à Vereadora Regina levantou em ti, ou no colectivo em que te inseres, cinco questões: A da capacidade de decisão dos eleitos do PCP, a dos atrasos nos pagamentos aos professores, a do Praiense, a da programação cultural, e a da “Bela e o Mestre”, que era a terceira mas passou para um post-scriptum depois de melhor consideração da tua parte. A subalternização da última indica que quiseste reduzir o seu relevo para não demonstrar a importância que a questão assume para ti. Para a próxima, lembra-te de re-numerar os parágrafos, senão o Estripador pode transformar-se num Hannibal Lecter e come um dos braços do teu discurso, é que aquilo que se vai tornar mais evidente quando olhares para o cadáver é o braço que lhe falta, e toda a gente se vai lançar em sua procura.

Aprecio, relativamente à questão da capacidade de decisão dos eleitos, que eu preferiria designar por autonomia e independência, a tua exposição em breves palavras do complexo sistema de tomada de decisões do Partido Comunista Português, complexidade essa que, em meu ver só é igualada pela do sistema da Igreja Católica. Depois de me dizeres que todos participam na decisão e que há um responsável que a assume, vens-me dizer para ficar descansado relativamente ao poder de decisão da Vereadora Regina apresentando-me a alegoria da vinda do Fidel Castro para a Câmara. Está bem, vou tentar acreditar em ti e vou ficar descansadinho…

Como há muitos anos me recuso a discutir contigo questões de dogma, pois já sei que nesse particular nunca iremos estar de acordo, vou-me abster de comentar o tecido que fazes em torno da justificação ideológica para a presença do Engº. Abreu na Câmara Municipal do Barreiro pois se me agrada ofender-te em privado, recuso-me a fazê-lo em público.

A tua interpretação das minhas palavras como qualquer espécie de elogio ao teu camarada António Abreu é apenas produto da imaginação, mas, de resto, estou habituado a ver todo o género de disparates a nascer da interpretação dos meus escritos, por isso, não importa, a beleza está nos olhos de quem a vê.

A minha referência à “Bela e o Mestre” foi apenas uma imagem metafórica que referi ao afirmar que pelo pouco que conheço da Vereadora Regina Janeiro me custa a acreditar em algumas coisas que me têm dito. Neste ponto, pela forma insinuadora em que o colocaste, não me adiantarei mais.

Relativamente aos professores, afirmas que estamos na base do diz que disse e respondes-me com boatos. Ó Helder, temos que ser sérios: Eu não me atreveria a escrever uma carta destas com base em diz que dizes, o atraso nos pagamentos aos professores foi um facto não foi um boato, assim como foi um facto o atraso dos pagamentos aos funcionários da autarquia, que tu escolheste ignorar na tua resposta, por não te dar jeito. É que eu poderia responder à demagogia das tuas insinuações acerca de posições nada mais nada menos que radicais que o governo do meu partido teria tomado contra os professores com a famosa resposta do “e vocês, que se dizem tão preocupados com os trabalhadores nem se preocupam em desculpar-se publicamente do atraso no pagamento dos ordenados.”

Também reparei que fugiste ao assunto da regulamentação dos apoios ao movimento associativo, o que me perturba de uma forma estranha.

No que diz respeito ao Praiense, vou esperar para ver. Acredito na oposição construtiva, mas não acredito em dar armas ao adversário, portanto, não te direi o que faria se fosse Vereador ou Presidente da Câmara.

O facto de me teres encontrado na Ópera não implica que a programação cultural não seja incerta, desfocada e conta-gotas. Digo-te mais, é tudo isto e é-o em cima do joelho. Concordarás decerto comigo quando te disser que qualquer política cultural só faz sentido se tiver objectivos de longo prazo e se produzir um envolvimento dos agentes criadores de cultura na formação do público e na sensibilização para a procura da cultura. Acredito tanto numa política cultural que apregoa variedade de eventos como numa que apregoe quantidade de espectáculos de fogo de artifício. O que está em causa não é a variedade nem a quantidade dos eventos.

A cultura deve ser encarada como um investimento na evolução de uma população, para isso é tão importante a divulgação, a sensibilização e a formação como são os eventos em si, pois o importante é o resultado a longo prazo em termos de evolução cultural da comunidade. Acredito no Barreiro como emissor-receptor de cultura e não como um simples consumidor de eventos, por mais diversificados que sejam. Portanto, o que eu não vejo na programação cultural da nossa terra é o reflexo de uma política cultura assumida a médio e longo prazo que passe da fase dos eventos para a fase dos nichos geradores de cultura e do apoio sério e efectivo aos agentes de produção cultural a nível local.

Se não te importas, reservo o plano completo para o meu contributo para o programa eleitoral do Partido Socialista para as próximas eleições autárquicas, é que estou desconfiado que vocês andam desorientados e estão à espera que alguém vos dê umas luzes. Por mim, prefiro esperar para ver o que é que vocês vão fazer e dar uma buzinadela sempre que entender que se desviaram demasiado do caminho correcto.

O Partido Socialista é, conforme sabes, um partido de homens e mulheres livres, por isso nada me obriga a identificar-me com a política cultural que foi seguida durante o mandato anterior, até porque não tive qualquer parte no seu desenvolvimento ou aplicação e até discordei publicamente de algumas das opções tomadas e considero que não foi feito um esforço sério de cumprimento do programa eleitoral, mas esse é o problema das organizações partidárias, é que nem sempre têm à sua frente as pessoas que nós gostaríamos que tivessem. Depois, uns podem ter os seus Abreus, outros não, ficam simplesmente à espera do cumprimento do princípio de Peter.

Com esta me fico.

Um abraço amigo do,

Pedro Estadão

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